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Para o próximo ano ...

Depois que me mudei de cidade, minha gatinha mais nova passou a trazer insetos para dentro de casa. Eu fico pensando, tentando entender, porque ela tem feito isso. Pode ser para chamar a atenção das irmãs que lá fora é muito mais divertido e que esconde várias novas aventuras. As outras duas gatinhas não saem, se limitam à sacada do apartamento que fica no térreo. Elas passaram seus cinco anos de vida no quintal de minha casa, onde nasceram e agora, na casa nova, parecem não ter coragem para o mundo lá fora. Esta situação me faz pensar em tanta coisa. Nas pessoas que não se arriscam, pois estão confortáveis onde e na situação em que se encontram. Nas pessoas que se arriscam demais, chegando a fazer inimizades para isto. E naquelas pessoas que seduzem para o risco. Ah, “viver é muito perigoso” … já disse Guimarães Rosa.


Acontece que o ato de trazer algum inseto não me parece ser intencional, ma sim instintivo. Não posso pensar que um felino faz algo para incitar outros felinos, fico mais confortável com a ideia de que ela ocupa a função de provedora entre elas. Ou prefere trazer a brincadeira para dentro de casa, seu ambiente. Ou simplesmente: gato faz isso mesmo. A situação em si me instiga pensar que nunca saberei o real motivo.

Agir com intenção é próprio do ser humano, pois intenção demanda escolha. Nós somos capazes de escolher em ficar na situação confortável ou mudar a sequência dos fatos. Somos tão poderosos por isto. Por termos esta capacidade. A capacidade de escolha. Nós racionalizamos sobre os fatos e pesamos o que será melhor ou pior a partir da escolha. Conseguimos projetar um futuro possível a partir da escolha que tomamos e depois somos obrigados a lidar com as consequências dessas escolhas. O desenrolar dos fatos.


É mais ou menos isso que fazemos quando o ano vai chegando ao fim e pesamos o que foi feito ou não no ano que passou e o que desejaremos fazer no próximo ano. Quando vai cegando o fim do ano parece que se aproxima uma linha divisória que apartará as boas escolhas das más. Como se o próximo ano fosse a oportunidade infinita de acerto. Daí fazemos as “ditas promessas” na listinha para o período que virá.


Eu sempre faço uma espécie de inventário do que foi meu ano: arrumei um emprego novo, desisti do emprego por me deixar doente, mudei de casa, plantei diversas mudas, publiquei um livro, escrevi outro a ser publicado ano que vem, comecei um projeto novo, entreguei meu coração mais uma vez e ele foi friamente recusado, aprendi uma receita nova, pintei uma parede, comprei uma câmera para registrar minhas caminhadas pelo mundo, desisti de algumas pessoas, revi minha lista de prioridades incontáveis vezes, não consegui superar a sensação de fracasso que me acompanha há alguns anos…


Revendo minha longa lista, o que faço há muito tempo com todas as listas, percebo que preciso fazer uma lista mais factível. A gente vai se adestrando ao mundo… sonhando menos, buscando mais o concreto, na tentativa de ticar mais itens realizados na próxima …


Penso que fazer as listas com intenção de sua exequibilidade não é o problema. O perigo está em abandonar a capacidade de sonhar, pois esta capacidade provoca uma outra aptidão que é a de criar. Olhar para as coisas de sempre com o olhar de primeira vez e ver nelas novas oportunidades. É como pegar um objeto já velho da casa e remodelá-lo para algo funcional e lindo, ou apenas num novo aspecto. Nem tudo tem que ter uma função, quando nos prendemos na ideia de funcionabilidade das coisas nos afastamos definitivamente da arte. E, acreditem, sem arte não há vida!


Para o próximo ano… a Pb (minha gatinha frajola) vai continuar trazendo seus insetos para casa, eu continuarei reorganizando minha lista de ano novo sem esquecer que há poesia, mesmo na dor, mesmo nas falhas, mesmo sem o amor da vida, mesmo sem o emprego perfeito, mesmo com o lascado da unha… mas no topo da minha lista desejo a arte como fio narrador de meus dias.


E você, já fez sua listinha?

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